sábado, 29 de julho de 2017

Agourosa

Eu não te aconcheguei
Mas a verdade é que no meu colchão
Houve quem "cheguei"
Inadvertida
Em nome do "ser gay"
Cheia de tesão
Porque a vida quis que só te olhando
Eu te pequei
Perigosa e desonrosa
Mas gulosa o suficiente
Pra engolir o agora.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Rima da Distopia

O meu eu
Te beija Romeu
Como destinatário
Da finada veterinária
Considerando o quanto sou animal
Apaixonado pela bela esperança
De rançar obstinada
Por uma história de amor
Que distorceu o meu racional
Em nome da minha dor.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Comunicado

Estás me ouvindo, amor,
Entre a estática da televisão?
Recebes a minha mensagem
Mergulhada nas notícias
Da previsão do fim do mundo?
Extrais a frequência rádica
Da escuta instalada ao pé do globo
Que te sussurra esquálida
Entre as falas da novela esdrúxula que passou?
Buscas minhas páginas nuas
Escondidas na rede,
Como se estratosférica
Eu te tocasse esotérica
Escondida na multidão?
Minha lembrança te comove incômoda e abstrata,
Espiritual de tão apagada
Porém ainda física remoendo os teus anseios
Mesmo que afogada de outras vidas
E bem aceita no tempo?
A minha voz tremula cada vez menos
Debaixo dos tapas que acumulas no aparelho,
Mas ela fica cá
Ruída na comunicação.

Consciente

Eu me perguntei hoje
"Por que a alteração de consciência é uma coisa tão boa?"
Mas no minuto seguinte a resposta me veio
Como uma mudança de domingo para segunda-feira:
Eu só percebo a marola batendo
No fígado inebriado
Porque é pequena a mudança de estado
E as pequenices são muito gostosas na nossa pequenez;
Só que a consciência é movimento constante
Entre traumas, amores e maturação
Que a gente não percebe o quanto é boa de viver
Por causa do saudosismo, inconstância e depressão
E principalmente da grandeza que acomete
O minúsculo ego que abraçamos
Com tanto afinco antes do perecer.

sábado, 22 de julho de 2017

Autopoemático

A minha capacidade está limitada
A um senso autoerótico elitizado
De poesia.
Eu me sinto a masturbação habilidosa
Que fica no seu espaço
Mental, sexual e fonético
Da rima visível
Tão risível e estúpida
Que eu quase ouço soar no fundo
Um poema profundo.
Estou limitado ao poema ético.
Pois que no português correto
Ou excessivamente formal
E gozado
Eu não tenho período pra frasar
E mesmo assim periódico
Pontuo ocasionalmente uma fase
Da qual, quando o álcool baixar,
Serei roubado -
Mas menos do sentido que encaixo
No último verso.

terça-feira, 18 de julho de 2017

Olho de Gato

Debaixo da oliveira
Um gato oportuno me toca
Ronronando suave com sua pelagem macia e preta
Rente ao meu lado;
Na sombra dos galhos
Seus olhos escuros brilham
Como um luar amarelo
Em meio ao calor ensolarado,
E sobre a grama quente e úmida em que me assento
Ele murmura silencioso um miado
Dizendo:
O mundo é uma íris profunda
De onde tu captas a luz
E se o olhares bastante,
Como outros olhos que fitas
Buscando a essência perdida na bruta cor,
Também nele a beleza encontrarás.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

Gema Colorida

Eu sou a tristeza como pedra lisa
Mergulhada e puxada pingando
Da leiteira da alegria -
Minha melancolia é dura como o céu
Onde os cometas penetram flamejantes
Para pousar na terra num estrondo
Deixando marcas de catástrofe
Num semi-sorriso riscado em fogo.
Eu sou as pinceladas coloridas
E a tela em branco
Num quarto escuro
Com fachos de luz ricocheteando
Somente completos dentro das bordas -
Somente completos em vida.

terça-feira, 4 de julho de 2017

Fruto do seu Tempo

Trafego em linhas comedidas
Com pulmão congestionado
Carregando minhas doenças incapacitantes
Amontoadas nos calos
Dos pés errantes destinados
A um desprincípio:
A vida moderna é o descomeçar -
Bater de frente com um enorme precipício
Que não se escala
E vai crescendo,
Criando sobre o corpo um vento de queda;
É afundar na terra dura
Mesmo se a envergadura
Não arreda perante a conjuntura.
As falas que falo
Desaparecem sob o peso das palavras erradas;
Eu reprimo alienado
O falatório enxuto de quem uma vez deu poesia ao mundo
E agora sabe só observar caroçudo
A seiva liquefeita engrossando transgênica
Englobando o mundo num olho turvo
Tão vermelho que serve só pra mastigar
E cuspir fora a pupila em seu centro.