quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Área Comum

Eu gosto - fazer o quê - do meu lugar comum.
O meu conforto fala por si,
Onde mais eu vou querer estar?
Onde mais eu vou reverberar again and again
Se não na recorrência de mim?
Eu me repito irrestrito na minha restrição,
Que nela eu vacilo uma rouquidão
Agravando ao tom
E a voz pode no seu som constante
Ressoar eventualmente um algo diferente,
Uma inovante repetição -
Um mantra elevador
Apesar de relevar aos mesmos andares
E suas supérfluas compartimentações.

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Síncope

Dentro da minha caverna
Reside um ciclope que forjou o fogo
E a partir dele o mito do pensamento.

A Pedra no Caminho

Eu nada sei de amor.
Eu sei de alguns resquícios -
Desejo, carinho, a linguagem mútua,
A dor, a raiva e às vezes até possessão.
Talvez até tenha sabido um dia,
Mas descobri numa epifania
Que amar é um caminho
A constantemente se fazer,
E esse pretenso amor sofrido que construí
Pensando ser o amor um estático monolito erguido rumo aos céus
É pura ilusão:
Sua rota leva apenas a uma religiosa admiração
De quem levanta os olhos sob o obelisco
Esperando que raie nas nuvens algo mais que trovão.
Eu desaprendi o amor
Contemplando a lápide do meu caminho
E hoje apenas velo em ritual.
Velo o fim de uma trilha de mim
Esperando que se abra na mata uma passarela
Sem passar a faca na espessa vegetação.
Eu nada sei
E quem sabe essa descoberta me permita recobrar os pés.

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

La Ley de Mi Deseo

(Havana - Camila Cabello)

Eu tenho deseo que se haga
Na Portucália como se faz
Em Guadalajara
De cuerpo lento
Levemente acelerado na mente
Mientras me conquista en la lengua
Do olhar.
Yo creo na sedução à lá colombiana
Republicana e subliminarmente engolida
Pelo calor tropical.
Yo soy meio cubana
Ilhada no mar quente de Revolución
Feito brinco inexistente
Brilhando num sussurro entorpecente ao pé do ouvido.
Soy calefacción demasiada adentro
Pra me tocares com algo mais
Que a tomada surdina
Contornando o rebolado do meu quadril
Buscando la llave
Sem nunca direto me destrancar.

Parada dos Versos

Eu vou parar de escrever
Porque minha mente está cansada
E mesmo que não estivesse não tem mais nada,
Além de que o meu estilo já está viciado
E eu me pego questionando o quão artístico realmente é um poema meu
- Se é que poesia é arte e não só poesia -
Aliás, não só o estilo mas os temas
- Céus, até este tema já está esgotado -,
Mas também porque não quero mais que me leiam
Nem nas páginas, nem nos pensamentos -
Cansei desse diário escuso
Que desmantela meus dias em vários pedaços avulsos
Filtrando meu tudo em linhas de raciocínio circular
Fingindo simultâneo o descaso com o leitor
E o desespero por atenção;
Escrever, fumar e beber estão exageradamente ligados
E disso tudo preciso parar,
Então eis aí mais um motivo.
Sem contar que versar requer uma vida mais movimentada que a minha
E mais versada,
Coisa que não sou.
Na verdade de forma geral faltam inspirações -
Transas, amores, emoções, pessoas, vazios, cheias, traições, redenções, expansões...
Enfim, outras versões de mim;
Eu não tenho motivos para me expressar,
Só motivos para parar
Antes que a aliteração me obrigue à continuidade
Do exercício frio e mal pago
- Taí mais razão -
Das minhas mãos que não calam a boca.

terça-feira, 21 de novembro de 2017

Poema Vitral

Deixa eu te contar do meu lugar:
A luz é baixa, quasisexy,
Na entrada castanha da porta semicerrada;
A luz é quasinada
De vela no fim do pavio
Pronta pra apagar.
A conversa é abafada e a janela fechada
Pra não entrar sopro nem sair barulho.
A decoração é de garrafas vazias
Quebradas e remendadas umas nas outras
Pra formar vasos de vidro colorido
Que filtram o ambiente esfumaçado
Encaixados nas luminárias escurecidas.
A mobília é velha e enrijecida
Pra sentar meio desconfortável retorcido
Forçando a coluna ereta contra uma almofada esvaecida.
O meu lugar é um sonho quase acordado
Naquela semiescuridão decantada em cor
De quem foi engolido por si.

quinta-feira, 16 de novembro de 2017

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Eu Sou

Eu aguento
A minha crise, o meu erro, o meu eu.
Eu aguento quem sou
Porque Eu Sou

Disse a brasa que treme dentro de mim,
Disse a vida, a existência,
O temor
Que
Eu.

Poema da Profanação

Vinde, mente, corpo
À origem do teu defeito:
A primazia do sacrossanto.
Deturpa a raiz,
Pois queimada no profano
Ela cede lugar com mais facilidade no solo,
E depois arranca os bulbos podres de retidão.
É hora de uma muda
Selvagem
Pra regenerar teu chão.
Vinde, mente, corpo,
Que as mentiras duvidosas
São o primeiro passo rumo às verdades,
Diferente do que pregaram na tua constrição.
Vinde que a profanidade
É agora a amiga mais íntima
Da humanização.

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Amanifesto

Resfria, mundo,
Que tuas engrenagens estão sobreaquecidas.
Mergulha na água fria...

Ou não.

Ferro quente subitamente gelado petrifica.
É melhor que sobrecarregue o sistema
E se desmonte num arremate -
Eu quero ser no mundo a queimar
Na velocidade do absurdo
Pra ver se a realidade
Como cortina de ferro estendida sobre a verdade
Desmantela.

Ou não.

Vai saber.

A história está acelerada demais pra predizer.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Poema da Desolação

Faria
A minha vida
Própria
Se não pro moinho
Farinha

Pulsação

Hoje amanheci
Com aquele órgão tubular
Corando cantos esgueirados
Da minha explicitude
Entalados na aorta.
Aquietei nas metáforas complexas demais
Para o poema me gritar engasgado
A fúria da tristeza profunda
Engordurada demais pra pulsar;
Tão envolta que fica parada
Entupida
Na minha súplica
De amar...
De amar...
De amar...
Do teu amar que não pulsa.
E eu parada cardíaca
Já aceitei o fatídico fim.

sábado, 4 de novembro de 2017

Captura da Inconstância

O mundo cabe num quadro muito preciso
Fora do qual fica difícil enxergar -
Se expando demais confundo
E não vejo contornos ou cores;
Se reduzo, seus detalhes não resistem
À minúcia com a qual os fito.
A estática, no entanto,
Não é seu estado habitual -
Pra encontrar seu habitat
Os meus olhos precisam sempre ajustar
O foco das lentes -
Ora abrindo, ora enclausurando -
E esse equilíbrio errante é difícil.
A córnea dói, as pálpebras palpitam,
O cérebro interpreta errado
E as imagens formam distorcidas
Na antecâmara ocular -
O mundo quase sempre está errado
Nos retratos que consigo
Oscilando entre frames
Sem formar-se estrito.
O movimento é, enfim, o quadro
Onde o mundo se desenquadra
A cada segundo que rapto e abandono
Num turbilhão de compreensões difusas.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Minha Pitchuca

Senti que o universo,
Tão frio, desconectado e avulso,
Me replicou -
Não porque você é minha idêntica
Nem minha continuação;
Não porque eu seja teu guia -
Mesmo que te mostre algumas portas
E queira te proteger dos monstros...
Você não é criança, mas é minha pequena -
É meu espelho vivo e ambulante
Independente
Cheia de arte viva.
Você é o desenho
Que eu remendei pra colar
Na minha parede
Como se colando a parede
Eu colasse a minha essência em mim.

Fado

Você quer rimado, poeta?
E cheio de sentido e significado?
Você quer transcender o teu estado
E o Estado
Com essa língua maculada,
Manca e enquadrada?
Deixa ela esquartejada
Na beirada da estrada
Longe da cortina de fumaça
Onde esfacela escassa
E traça suja o alimento para as traças!
Abandona ela onde ela
O pensamento e a palavra -
E nisso tudo o que consegues?
A encruzilhada entre o silêncio e o nada.
Aceita então que tú no eres nada
Além dos quereres do linguar -
Que tua língua balança viciada
Na tua boca e teu pensar
E limitado acede
Que o poema não transcende além da parca agonia
Do fado.

Poema Ruim

Eu já sou demais pra ser apático
Então prefiro estar hepático.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Jazigo da Consciência

A cada fase que reflito
Fico preso numa frase
Aonde inflo até a crase
E lá o sentido jaz escrito
Esquisito em epitáfio
Sob um ninfo alado
De dúvida trajado
Me julgando empáfio
Até que um grito
Trema a terra em sua base
E fora dela se estenda
O braço alado aflito
Buscando uma hemodiálise
Onde novo se me entenda.