quinta-feira, 29 de março de 2018

O Ilusionista

É engraçado como as coisas flutuam
Em seu estado mental;
Elas se transfiguram de acordo a dança das luas,
Subindo as margens de um ou outro ideal
Elásticas conforme a figura
Que desejam fazer de si.
Lembro, por exemplo, de odiar amores platônicos
Por destruírem a minha constância
E esticarem as pontas da mente
Até quase o rasgo da vazão;
Recordo quando os cria
Um veneno pernicioso ao amor realista,
Enchendo-o de expectativas
Que terminariam por me naufragar no isolamento;
Mas também vi o platonismo
Como o filtro onde se retêm
Os anseios que ninguém sacia,
Deixando-me mais leve
Para voar de amores.
A mente escorrega difusa
Entre os conceitos que cabem na navegação
Usando-os como velas içadas ou recolhidas
Conforme o vento que lhe toca -
E o vento nunca sopra numa única direção.

Difícil mesmo é distinguir a própria mente
Na corredeira de pensamentos -
Ela é mar, ela é barco ou é vento? você me pergunta,
Ao que a resposta retorna confusa
Mergulhada na mistura de significação.
O poeta, no fim, não passa de um ilusionista
Escondendo e mostrando as cartas
Até encontrares no movimento
Uma razão desvairada
Que na verdade não passa de emoção
Fantasiada de sentido da vida.

quarta-feira, 28 de março de 2018

Os Quereres

A vida pode ser o que você quiser -
Só esqueceram de dizer
Que esse negócio de querer é complicado demais.
Às vezes teus quereres vão querelar
E preferir se apagar
Pois dentro da mente há tanta coisa
Que o que queres pode se perder
Na hora de despachar;
Noutras ainda vão bater de frente
Com o querer de quem vem lá
E aí tem que se organizar -
Você, os teus quereres e os outros seres
Cujos quereres estão do lado de cá,
E até a vida atender a querelância
Pode ser que ela já tenha vindo a acabar.
E ai de quem disser que nessas palavras verdade não há!
Só nega as trevas do querer
Quem prefere mentir para negar direitos
Ou para a si próprio consolar.

Éon

A cada era
Que a minuta ata
Aterra mais um terabyte
Da inocência que minha pele
Só consegue escapar divagada
Nas esferas subterrâneas
Das órbitas cibernéticas
E seus vazios de profundeza infernal.

E cada fera
Que desuso engaiolada
Nas palavras-cemitério
Não consegue enclausurar
O jorro imundo me escapando
No suor de bailarino
Que a cada rotação se decepciona
Com a imperfeição do movimento
E espalha riscos de molhado
Fétido e melado sobre o chão.

E a terra gira
E jorra infinda
Até que apague sua entranha
E sobre estranho o seu casco
Por um tempo no infinito
E então sobre só tempo
E então nem isso.

domingo, 4 de março de 2018

O Lugar Encantado

O meu encanto
Está escondido no mesmo lugar
Onde o horror de mim transborda.
O espaço onde desabrocha
Minha personalidade
É um cemitério bem adubado
Pras flores crescerem.