sexta-feira, 14 de abril de 2023

Lamento

Toca distante,
No ecoar uivante dos montes
Em que derretem as minhas memórias,
Um sino.
Toca lamurioso,
Cheio de melancolia,
Como se tivesse saudades
De um outro dia
Há muito esquecido
– Há tanto que já nem me lembro
Se sequer existiu.
Seu eco retumbante me seduz,
Ressoa no meu peito
E encontra nele o ar em estado perfeito
De rarefação
Para reluzir uma sombra de monção,
Daquelas que criam no horizonte um inalcançável arco-íris
Lacrimejado no céu cinza e úmido.
Meu corpo hoje é todo canção,
Um cântico antigo
Escorrendo sobre as pedras,
Soprando pela grama
E se escondendo no desconhecido
Do meu coração.
Eu hoje sou todo antigo,
Sou monumento esquecido,
Dedicatória em ruína
Que restou de um mundo perdido
Cujas palavras jazem sumidas,
Sussurradas ao léu no vento
Que traceja seus resquícios na areia do chão.
E – é estranho – chega a ser bonito
Esse lamento escondido
Viajando silencioso na imensidão.