Você devia parar
Com essa mania de esgueirar suas mãos
Debaixo do meu travesseiro
Mergulhando os dedos no meu cabelo
Por sob minha pele
E através do cerebelo
Pra tocar meu núcleo almoso
E, com seu roçado dengoso e discreto,
Se infiltrar nos meus sonhos.
Devia parar
De alcançar-me daí
Da sua margem do lago
Com seus braços sinuosos,
Seus rios de abraço
Me engolfando em remanso
E assoprando as conchinhas
No leito do ouvido
Pra me marejar ondulado
E me navegar balançado
À luz dos espíritos noturnos.
Devia parar de me encontrar
Quando estou desarmado
Das minhas razões
E noções de cuidado,
Quando teus dedos fazem mais estrago
Arranhando o tecido do meu lado sensível
E logo curando o machucado
Com o toque macio do teu úmido lábio.
Eis aqui, outra vez, o meu lado inerte
Guiando o translado
Encontrando em você
Algum significado
Perdido nas covas profundas
Dos meus naufrágios.