quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Pelo grosso

Teu despencado
Agourado sonolento
Leão barrigudo
Escapa sortudo
Do escasso soar
Que num tudo leoa feliz,
Feroz e ferido
Até que poema
Se perca felpudo
Na juba que acaricio
Em eterno confuso rimar.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Nervo contra osso

Tudo calou
De tal maneira que doeu.
O calo que irrompeu
Contra a pele
Bagunçou os nervos
Espremidos sobre osso,
E eis que dos gemidos tímidos nasceu
Uma flor de pus que escorreu
Silenciosa como a calada
De onde brotou.

Facejado

Quem é você quando não estou
Ou o dia acabou
Na noite apocalíptica do ser?
Quem é esse rosto
Que de vício se apagou
No tanto que beijei
Com esses lábios carniceiros?
Tento me dizer que és elíptica,
Mas há tantas palavras
Escorridas no assoalho
Que a pele e os olhos
Jazem... Onde?
Em algum lugar troquei
As faces pelas frases - pensamentos.
Deve ser em nome do conforto que me traz
Ver o mundo refletido em caveira seminua,
Fonética, silábica,
Em sons que só no meu tom pude ler.
Quero estar em busca de traços
Que só nos laços da expressão
Não se possam apreender,
Mas é duro transpassar
Uma forma viciada de viver;
Até que um dia eu acorde atordoado
E não conheça a tua face,
Pois mudou noite passada -
Aí, então, no susto vou entender.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Sonho translúcido

Um dia...
Ah, esse dia tal...
Um dia o malabares vai passar;
As esferas de vidro vão flutuar
E não vou mais precisar de um equilíbrio
Insano, insonso, vazio,
Pilhado nessa escassa
Passagem de ser
Que reprime, releva, remuda
Na confusa escuridão de escuso transparecer.
Um dia pouco importará
Se o vidro quebre no chão ou estoure no espaço;
Passará elétrico no céu
Num impulso fluido,
E a translucidez que me devora,
Seca a alma e evapora,
Tornará em alabastro
A firmemente plantear infinito
Daqui ao mais além.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Torção

Meio a meio o céu implode
Côncavo entre pureza
E nuvens laranja
Na calada da noite clara
Que não cala nem limpa
No seio do batimento
A pintar seu caimento.
Luz cai do céu,
Luz sobe da terra,
Luz floresce inteira
No recôncavo do preto
Até a terra torcer
Um céu de rodamoinhos coloridos
Na madrugada
Feito pano exprimido
Pingando ondas arco-íris
No balde iluminado.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Cortina III

Meu chumaço é fuligem
A polvorenta esfarelar
Como poeira que devo varrer,
Mas para onde
Se em todo lugar
Sobra forro vermelho?
Fico tal qual travesseiro de penas
A deplumar e vazar
Por entre a fronha.
Assim passo - a escorrer seiva rouge
Manchando os sofás,
Os lençóis e o assoalho
Até no tecido em pano murcho
Só a extensão do tempo sobrar.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Cortina II

De tempestade e cor
Não há como pôr
Mais que um sol
De fosco amarelo
Que clarifica, escurece,
Brilha e estarrece
Inundando os pulmões em areia.
Não há nada que possa
Perturbar e encontrar
Tão ao ponto quanto
O furor com que o chão
Ascende aos céus
Fazendo cortina de contramão.

Cortina I

A chuva veio passar na cidade
E voou numa onda
De lá para cá.
Ela bordou a janela em cinza,
Tapou as ventanas
E me contornou.
Então sugou o meu ar,
Entrou na minha casa,
Pairou em guerra
E amortecimento
Até que em cinza
Meu tom se tornou.

Tragada

Trôpego
Em pêssegos podres
É o rolar de câmera lenta
Na roda-gigante da fantasia.
Ela, que não se conforma na
Vida, embebeda-se em si
E sai a andar alegórica
Em romaria.