Gute Nacht, de Franz Schubert
A casa que tanto abrigou minhas melancolias
Hoje parece-me estranha.
Saiu do lugar e partiu à nevasca.
Vejo pela janela as placas de rua artesanais,
Os pinheiros esguios e flocos de neve
Dependurados em galhos secos
Assumindo uma cor rosada, fingindo ser botões.
Há ainda umas samambaias espiando escondidas na ilusão,
Uns coqueiros migrados tentando entender
A alvura do chão.
Mas sobremaneira me arrematou a jornada de inverno
E de resto aqui estou.
Um chalé repentino nos Alpes
Cercado pela escuridão de florestas
Num misto desnudo e pinhal.
Nada me é natural.
Onde, samambaia, foi parar minha terra cabal?
Não posso com esse Natal medieval,
Essa cruz exposta em risco sobre o vidro.
Sou anti-cristo... Anti-cristo demais para isto.
Volta-me, Mefistófeles, à rua da minha vida;
Faz sumir a agonia desses ares arredios,
Condena-me novamente à sofreguidão do sol.
Põe, ao menos, a imagem da Virgem
Embaçada na vidraria;
Que eu toque seus lábios até apagarem
No sopro de meus ansiosos pulmões.
Volta, bananeira, do teu funeral.
Sai da brancura sepulcral,
Estende suas folhas e deixe que as toque.
Mas como? Como aqui vim parar
Junto aos restos apagados do meu tropical
Embalado na neve e no gelo externos?
E assim, como súbita, vem a gangrena
E o sono vadio,
Tão perfumoso em seu chegar.
Com eles, a samambaia
E um alívio -
Mesmo sabendo delírio dentro do delírio,
A jornada chega a seu final.
Nenhum comentário:
Postar um comentário